Em sua sessão de julgamento de 05/10/2022, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) julgou mais um procedimento administrativo para apuração de ato de concentração (APAC), com reconhecimento, ao fim, de prática de gun jumping, consistente na consumação de operação sem a devida notificação prévia. O procedimento, que tratou de dois atos de concentração envolvendo empresas do Grupo Grand Brasil, foi encerrado com celebração de Acordo em Controle de Concentrações (ACC) e pagamento de contribuição pecuniária de mais de R$ 2,5 milhões.
Instaurado em 2019 pela Superintendência Geral do Cade (SG), o APAC avaliou principalmente a necessidade de notificação obrigatória das seguintes operações: (i) a transferência de concessão de revenda Renault e de ativos tangíveis pela Grand Brasil à Bis Distribuição de Veículos Ltda. (“Bis”), cujo contrato foi celebrado em 29/03/2016; e (ii) a aquisição de ativos tangíveis e intangíveis da BMMOT Comércio de Veículos Ltda. (“BMMOT”) por empresa também do Grupo Grand Brasil, com contrato datado de 19/12/2018. Em relação a esta última descartou-se a necessidade de notificação em razão do não preenchimento do critério de faturamento dos grupos econômicos envolvidos.
No que diz respeito à primeira operação, houve discussão sobre incidência de prazo prescricional para aplicação de multa, considerando o lapso temporal maior que 5 anos entre a data do contrato e decisão do Tribunal. O Cade posicionou-se em linha com sua jurisprudência e com Parecer da Procuradoria Federal Especializada junto ao Cade, considerando gun jumping como ilícito permanente que se projeta no tempo enquanto durarem os atos decorrentes da operação. Assim, ficou afastada a possibilidade de prescrição.
Avaliou-se também se, no mérito, os ativos transferidos seriam essenciais para o desenvolvimento da atividade econômica das partes, caracterização necessária para configuração de ato de concentração nos termos do art. 90, II da Lei 12.529/2011[1] (hipótese de configuração de ato de concentração por compra ou permuta de ações, quotas, títulos ou valores mobiliários conversíveis em ações, ou ativos, tangíveis ou intangíveis). Nesse ponto, conclui-se que os bens envolvidos na operação fariam parte do conjunto de ativos empregados na atividade de comercialização de veículos novos em diferentes municípios e, portanto, restaria caracterizado o ato de concentração para fins de sua notificação.
Finalmente, a decisão ressaltou que o pagamento da contribuição não exime as empresas do dever de notificar o ato de concentração, que segue sendo obrigatória para que os efeitos de sua consumação passem a ser regulares.
O voto do Conselheiro Relator Victor Oliveira Fernandes está disponível para consulta neste link.
[1] Art. 90 -Para os efeitos do art. 88 desta Lei, realiza-se um ato de concentração quando:
II – 1 (uma) ou mais empresas adquirem, direta ou indiretamente, por compra ou permuta de ações, quotas, títulos ou valores mobiliários conversíveis em ações, ou ativos, tangíveis ou intangíveis, por via contratual ou por qualquer outro meio ou forma, o controle ou partes de uma ou outras empresas.