Na última sessão ordinária de julgamento (SOJ) de 2022, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) aprovou joint venture entre empresas do setor automotivo para o compartilhamento de informações, no âmbito do Gaia-X e Catena-X. A aprovação ficou condicionada ao cumprimento de restrições impostas unilateralmente, nos termos do voto do Conselheiro Gustavo Augusto, que havia avocado o caso anteriormente para uma análise mais ampla. Antes da avocação, o caso havia sido aprovado sem restrições pela Superintendência-Geral do Cade.
Ao avaliar o poder de mercado das empresas, o Conselheiro Gustavo Augusto identificou uma concentração de quase 70% nos mercados de fabricação de caminhões e ônibus. Ao mesmo tempo, como os mercados afetados seriam muito amplos, o Relator entendeu que seria necessário avaliar o poder conglomerado das empresas. A sua união na joint-venture, afinal, poderia geria sinergias expressivas, com potenciais problemas concorrenciais.
Nesse sentido, diversos riscos nesse mercado também foram destacados, tais como (1) a padronização de sistemas pode reduzir os incentivos para que as empresas inovem; (2) os mercados automobilísticos costumam ter casos de cartel recorrentes, que podem ser ainda mais incentivados a partir da troca de informações sensíveis; e (3) dificuldade em identificar exatamente quais informações seriam trocadas e nem como elas seriam apresentadas (granuladas, aglomeradas, atuais e antigas).
Diante dessas preocupações, as partes apresentaram uma proposta de acordo em controle de concentrações (ACC), que foi rejeitada pelo Conselheiro Gustavo Augusto por entender que a proposta era insuficiente para sanar todas as preocupações concorrenciais. Por essa razão, o Cade impôs restrições unilateralmente, a partir de um termo de adesão com obrigações e responsabilidades direcionadas a evitar riscos ligados à troca de informações sensíveis. Essa foi a primeira vez em que o Tribunal do Cade aplicou um remédio de maneira unilateral e por adesão, sem que houvesse a negociação de condições em comum acordo com as partes. O termo de adesão contém obrigações como: (i) armazenamento das mensagens trocadas por 5 anos e respectiva apresentação de tais informações ao Cade em caso de requisição; (ii) definição de lista de informações que podem e que não podem ser compartilhadas; (iii) compromisso de enviar ao Cade o conteúdo de mensagens suspeitas; (iv) implantação de software de rastreamento para identificar trocas de dados potencialmente sensíveis; dentre outras.
Nesse caso, para que a joint-venture seja implementada na prática, as requerentes deverão assinar o termo de adesão. Caso contrário, a operação será reprovada e as empresas não poderão trocar informações no âmbito do Catena-X. Do mesmo modo, se alguma nova empresa vier a fazer parte da joint-venture, o Tribunal do Cade deverá avaliar as suas condições, antes que a entrada seja aprovada.